Liberalismo clássico
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O liberalismo clássico é uma doutrina ou corrente do pensamento político que defende a maximização da liberdade individual mediante o exercício dos direitos e da lei. O liberalismo defende uma sociedade caracterizada pela livre iniciativa integrada num contexto definido. Tal contexto geralmente inclui um sistema de governo democrático, o primado lei, a liberdade de expressão e a livre concorrência econômica.[carece de fontes ]
O liberalismo rejeita diversos axiomas fundamentais que dominaram vários sistemas anteriores de governo político, tais como o direito divino dos reis, a hereditariedade e o sistema de religião oficial. Os princípios fundamentais do liberalismo incluem a transparência, os direitos individuais e civis, especialmente o direito à vida, à liberdade, à propriedade, um governo baseado no livre consentimento dos governados e estabelecido com base em eleições livres; igualdade da lei e de direitos para todos os cidadãos.[carece de fontes ]
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[editar] Origem do pensamento liberal
As origens mais antigas do liberalismo clássico remontam a pensadores antigos como Aristóteles e Cícero
O Liberalismo pode encontrar algumas de suas raízes no humanismo que se iniciou com a contestação da autoridade das igrejas oficiais durante a Renascença, e com a facção Whigs da Revolução Gloriosa na Grã-Bretanha, cuja defesa do direito de escolherem o seu próprio rei pode ser vista como percussora das reivindicações de soberania popular. No entanto, os movimentos geralmente tidos como verdadeiramente "liberais" surgem durante o Iluminismo, particularmente o do partido Whig de Inglaterra, os filósofos em França e o movimento defensor do auto-governo na América colonial. Estes movimentos opunham-se à monarquia absoluta, mercantilismo, e diversas formas de ortodoxia religiosa e clericalismo. Foram também os primeiros a formular os conceitos de direitos individuais e do primado da lei, bem como da importância do auto-governo através de representantes eleitos.
O enfoque na "liberdade" como direito político essencial das pessoas foi repetidamente defendido ao longo da história: o conceito básico da liberdade foi criado durante a Idade Antiga na Grécia; na Idade Média as cidades italianas se revoltaram contra os Estados Pontifícios papais debaixo da bandeira da "liberdade", e, um século e meio depois, o filósofo Nicolau Machiavel fez da defesa das liberdades civis a chave da forma republicana de governar. A resistência holandesa ao opressivo catolicismo espanhol é freqüentemente apontado como outro exemplo; apesar da recusa em conceder liberdade de culto aos católicos, é usualmente considerado uma luta predecessora dos valores liberais.
A história do liberalismo como ideologia consistente, ou seja, em que a liberdade não é algo de acessório, mas a base fundamental dos direitos políticos e mais tarde do próprio Estado, começam a tomar forma como resposta ao absolutismo político e ao realismo no Reino Unido. O corte definitivo foi a concepção de que os indivíduos livres poderiam formar a base da estabilidade política em vez de terem licença de agir, desde que não colocassem em causa a estabilidade política. Esta concepção é geralmente atribuída a John Locke (1632-1704), cuja obra (Dois tratados de governo) estabeleceu duas ideias liberais fundamentais: liberdade econômica, ou seja o direito de possuir e usufruir da propriedade, e a liberdade intelectual, incluindo a liberdade de consciência, a qual é exposta em Da tolerância (1689). No entanto, ele não estende essas concepções de liberdade religiosa aos Católicos. A Escolástica Tardia foi a grande base doutrinal da obra de Locke, para além da realidade concreta em que viveu. Recolhe a ideia, sobretudo de Francisco Suárez e Juan de Mariana, jesuítas espanhóis que defenderam o direito natural como base dos sistemas políticos, onde o homem entrega o poder para ser exercido por terceiros, mas mantendo sempre o direito de o assumir novamente, nos casos de injustiça. Estes autores reconhecem inclusive o direito à revolta, à revolução e ao tiranocídio, ou seja o derrube pela força do mau governante. Juan de Mariana vai mais além e defende que a sociedade e a liberdade individual se baseiam na propriedade. Locke desenvolve posteriormente a ideia de lei natural\direitos naturais, os quais ele define como "vida, liberdade e propriedade". A sua "Teoria do Direito Natural" é o antepassado distante da moderna concepção de Direitos Humanos. No entanto, para Locke, a propriedade era mais importante do que os direitos de participar no governo e no processo público de decisão: ele não defendia a democracia, porque receava que ao se dar o poder ao povo se provocaria a erosão da santidade da propriedade privada. No entanto, a idéia de direitos naturais desempenhou um papel chave na sustentação ideológica na Revolução Americana e na fase inicial da Revolução Francesa.
No continente Europeu, a doutrina do primado da lei, mesmo sobre os monarcas foi sustentada por Montesquieu em seu O espírito das leis. Neste trabalho, é defendida a idéia que "é melhor dizer que é preferível o governo mais conforme a natureza é aquele que melhor coincida com a vontade e disposição das pessoas em favor do qual é estabelecido," ao daquele estabelecido meramente pela força. Prosseguindo na mesma via, o economista político Jean-Baptiste Say e Destutt de Tracy foram os mais ardentes defensores da "harmonia" do mercado e deram provavelmente origem ao termo laissez-faire]].
Na segunda metade do século XVIII emergiram duas escolas de pensamento particularmente relevantes para o pensamento liberal. Na Suécia-Finlandia o período de liberdade e governo parlamentar entre 1718 e 1772 viu surgir o parlamentar Anders Chydenius. O seu impacto deu-se sobretudo na região nórdica, mas também teve importantes consequências noutras áreas.
A outra escola é derivada do "iluminismo escocês", influenciando pensadores como David Hume, Adam Smith e por fim Immanuel Kant.
Embora Adam Smith seja considerado como o mais famoso dos pensadores liberais, ele teve antecessores. Os fisiocratas em França propuseram-se estudar a política econômica de forma sistemática e a natureza da auto-regulação dos mercados. Mais relevante ainda, no seu livro 1765 book The National Gain Anders Chydenius foi o primeiro pensador a publicamente propor a liberdade de comércio e a definir os próprios principios do liberalismo, onze anos antes de Adam Smith no seu livro a riqueza das nações em 1776. Benjamin Franklin, por seu turno, defendeu a liberdade para a indústria norte-americana em 1750.
O escocês Adam Smith (1723-1790) expôs a teoria de que os indivíduos poderiam estruturar a sua vida económica e moral sem se restringirem às intenções do Estado, e pelo contrário, de que as nações seriam tanto mais fortes e prósperas quanto mais permitissem que os indivíduos pudessem viver de acordo com a sua própria iniciativa. Defendeu o fim das regulações mercantis e feudais, dos grandes monopólios estatais ou similares e é encarado como o defensor do principio do "laissez-faire" - o governo não deveria tomar posição no funcionamento livre do mercado. Adam Smith desenvolveu uma teoria de motivação pela qual tentou conciliar o interesse egoísta individual com a desordem social (sobretudo no Teoria dos Sentimentos Morais (1759)). O seu famoso trabalho, A Riqueza das Nações (1776), tentou explicar como o mercado com certas precondições naturalmente se auto-regularia por intermédio da agregação das decisões individuais e produziria muito mais eficientemente do que os pesados mercados regulados que eram a norma no seu tempo. As suas premissas eram a de que o papel do governo não deveria ter uma intervenção em áreas onde o lucro não poderia ser a motivação, e prevenir os indivíduos de usarem da força ou fraude para alterarem a livre competição, comercio e produção. Defendia que os governos deveriam apenas intervir fiscalmente em áreas onde as mesmas não tivessem impacto nos custos económicos, seguindo a teoria de Hume sobre circulação monetária, argumentando que era a produção de riquezas e não o total de ouro que representava a "riqueza" de uma nação.
Kant foi fortemente influenciado pelo empirismo e racionalismo de David Hume. O seu mais importante contributo para o liberalismo foi na área da ética, particularmente a sua asserção do imperativo categórico. Kant defendia que os sistemas resultantes da razão e da moral estavam subordinados à lei e moral natural, e portanto, quaisquer tentativas para as subverter só trariam o fracasso.O seu idealismo, foi estruturante, na visão de que existiam verdades fundamentais que os sistemas racionais não poderiam ignorar e nas quais se deveriam basear. Tal entendimento fazia a ligação com o Iluminismo Inglês o qual estabelecia a existência de direitos natural.
[editar] Controvérsias
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[editar] Liberalismo e escravidão
No livro Contra-História do Liberalismo, o marxista [1] Domenico Losurdo mostra que existia o paradoxo de, na Inglaterra, nas suas colônias na América do Norte, e na Holanda, entre os séculos XVII e XIX, entre quem defendia o liberalismo e simultaneamente defendia a continuação do sistema de escravidão. Tal atitude não surpreenderá no entanto os melhores estudiosos do marxismo, sabendo-se bem da relevância positiva que Karl Marx fez da escravidão:
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- É a escravidão que tem dado valor às colônias, foram as colônias que criaram o comércio mundial, e o comércio mundial é a condição necessária para a indústria de máquina em grande escala. Conseqüentemente, antes do comércio de escravos, as colônias emitiram muito poucos produtos ao mundo velho, e não mudaram visivelmente a cara do mundo. A escravidão é conseqüentemente uma categoria econômica de suprema importância, Carta de Karl Marx a Pavel Vasilyevich Annenkov, Paris
Escrita em 28 de dezembro de 1846 Rue d'Orleans, 42, Faubourg Namur.
Raramente os primeiros defensores do liberalismo se colocaram contra a escravidão, e freqüentemente a defenderam ou lucraram com a mesma. Locke, por exemplo, um dos pais do liberalismo, defendeu a escravidão e investiu em empresas de tráfico de escravos.
Tais práticas e idéias mostram que, no passado, o liberalismo tendeu a ser a defesa da maximização da liberdade individual de um pequeno grupo de pessoas, ao mesmo tempo em que foi uma teoria e prática da desumanização de pessoas de outras etnias. Historicamente, os teóricos do liberalismo negaram a humanidade a irlandeses católicos, negros africanos e ameríndios, dizendo que o tratamento brutal aos mesmos lhes faria bem, pois lhes levaria à civilização.
O mainstream do pensamento econômico liberal e dos marginalistas da época tinham uma visão praticamente "racista" das atividades econômicas. Jevons, analisando as relações do trabalho, disse:
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- É evidente que problemas desse tipo dependem muito da índole ou da raça.Pessoas de temperamento enérgico acham o trabalho menos penoso que seus camaradas e, se elas são dotadas de sensibilidade variada e profunda, nunca cessa seu desejo por novas aquisições. Um homem de raça inferior, um negro, por exemplo, aprecia menos as posses e detesta mais o trabalho; seus esforços portanto, param logo. [2]
John C. Calhoun,[3] importante estadista e filósofo político dos EUA durante o século XIX, sétimo vice-presidente dos EUA, ao mesmo tempo que, sob inspiração de Locke, defendia apaixonadamente a liberdade do indivíduo, não via a escravidão como um mal necessário, mas sim como um bem positivo, essencial para a civilização, por ser uma forma de propriedade legítima, e amparada pela constituição dos EUA.[4]
John Locke, o filósofo da liberdade individual ante a lei, participa da redação da constituição da Província da Carolina, segundo a qual:
- [...] todo homem livre da Carolina deve ter absoluto poder e autoridade sobre os seus escravos negros seja qual for sua opinião e religião.[5]
Além disso, Locke fez sólidos investimentos no tráfico de africanos.[6]
Também houve liberais que defenderam a escravidão dos pobres. Entre eles se encontram Andrew Fletcher e James Burgh. Francis Hutcheson, o mestre de Adam Smith, tinha reservas à escravidão dos negros, mas considerava a escravidão das pessoas dos "níveis mais humildes" da sociedade como uma "punição útil".[7] Diz ele que a escravidão dos pobres é:
- [...] castigo normal para aqueles vagabundos preguiçosos que, mesmo depois de ter sido justamente advertidos e submetidos à servidão temporária, não conseguem sustentar a si próprios e às suas famílias com um trabalho útil.[8]
Adam Smith, um dos pais do liberalismo, percebeu que, no que diz respeito à escravidão, os "governos despóticos" são preferíveis aos "governos livres", pois nos últimos só os proprietários brancos têm representação política. Por isso, ele vê como desesperadora a situação dos escravos negros nos "governos livres", pois:
- [...] toda lei é feita pelos seus donos, os quais nunca vão deixar passar uma medida favorável a eles.[9]
Por isso:
- A liberdade do homem livre é a causa da grande opressão dos escravos [...].[10]
Notas
- ↑ Domenico Losurdo, Contra-História do Liberalismo (Aparecida, SP: Idéias & Letras, 2006, trad. Giovanni Semerano), publicado em italiano em 2005 como Controstoria del Liberalismo.
- ↑ JEVONS, S. A teoria da economia política. Sâo Paulo: Abril Cultural, 1987. (Coleção Os Economistas). p. 116.
- ↑ Além de ser um estadista ligado ao liberalismo clássico, o neoliberalismo também se inspira em Calhoun. A editora de viés neoliberal Liberty Fund reeditou sua obra Union and Liberty.
- ↑ Ver Losurdo, Contra-História do Liberalismo, pp. 13-14.
- ↑ John Locke, The Fundamental Constitutions of Carolina (in David Woottom (ed.), Political Writings, London e New York: Penguim Books, 1993; apud Losurdo, Contra-História do Liberalismo, p. 15.
- ↑ Ver Losurdo, Contra-História do Liberalismo, p. 16.
- ↑ David B. Davis, Il Problema della Schiavitù nella Cultura Occidentale (Torino: SEI, 1966, trad. Maria Vaccarino), pp. 423-427; apud Losurdo, Contra-História do Liberalismo, p. 17.
- ↑ David B. Davis, Il Problema della Schiavitù nella Cultura Occidentale, p. 425; apud Losurdo, Contra-História do Liberalismo, pp. 17-18.
- ↑ Adam Smith, Lectures on Jurisprudence (Indianapolis: Liberty Classics, 1982), pp. 452-453; apud Losurdo, Contra-História do Liberalismo, p. 18.
- ↑ Smith, Lectures on Jurisprudence, p. 182; apud Losurdo, Contra-História do Liberalismo, p. 18.