Tao Te Ching
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O Tao Te Ching (道德經 [ Listen?]), ou Dao de Jing, comumente traduzido pelo nome de "O Livro do Caminho e da sua Virtude" , é um dos antigos escritos chineses mais conhecidos e importantes.A tradição diz que o livro foi escrito em cerca de 600 a.C. por um sábio que viveu na Dinastia Zhou chamado Lao Tzi ("Velho Mestre"),como um livro de provérbios relacionados ao Tao , e que acabou servindo como obra inspiradora para diversas religiões e filosofias , em especial o Taoísmo e o Budismo Chan(e sua versão japonesa o Zen).
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[editar] Origens
Como a maior parte das figuras mitológicas dos fundadores de religiões , a vida do escritor do Tao Te Ching , Lao Tzi é envolto em lendas. Segundo a tradição Lao Tzi nasceu no Sul da China cerca de 604 a.C sendo superintendente judicial dos arquivos imperiais em Loyang, capital do estado de Ch'u. Desgostoso pelas intrigas da vida na corte, Lao Tzi decidiu afastar-se da sociedade seguindo para as Terras do Oeste. Montado em uma carroça guiada por um boi ,seguiu viagem, mas ao atravessar a fronteira, um dos seus amigos, o policial Yin-hsi, o reconheceu e lhe pediu que escrevesse seus ensinamentos antes de partir. Lao Tzi então escreveu o pequeno livro conhecido posteriormente como o Tao Te Ching , e partiu em seguida. Segundo a história, morreu em 517 a.C. Lao Tzi foi canonizado pelo imperador Han entre os anos 650 a.C. e 684 a.C
Os mais recentes estudos apontam para que o Tao Te Ching tenha sido escrito por Lao Tzi entre 460 a.C. e 380 a.C. Algumas lendas dizem que o Tao Te Ching estava gravado numa série de réguas de bambu. O texto ia passando de uma régua para outra e, como entretanto elas foram baralhadas, ninguém sabe hoje a sua ordem exata.
Este livro não originou o Taoísmo nem o conceito de Tao : tais já eram de uso corrente antes da escrita do livro.Mas ele serviu como obra de apoio para as religiões que aderiam à idéia do Tao (Caminho) como a base da existência de todas as coisas.
[editar] Interpretação
As diversas correntes do pensamento religioso e filosófico através dos tempos atribuiram milhares de interpretações diferentes ao sentido do Tao Te Ching.Porém , o tema principal do livro é localizado em seu primeiro provérbio :"O Tao que pode ser dito não é o Tao Verdadeiro".O Tao Te Ching situa a origem de todas as coisas no Tao ( Caminho , Senda), que longe do conceito de Deus nas religiões deístas , é um príncipio inimaginável ,ininarrável , eterno e absoluto , que não pode ser compreendido , já que qualquer tentativa de classificá-lo ,cria uma dicotomia que não pode existir em algo Eterno e Absoluto.Já que o Tao não pode ser compreendido , o Tao Te Ching enfatiza que não existem meios de manipulá-lo.Logo os seres devem viver uma vida simples , sem grandes questionamentos morais ou filosóficos ,onde se enfatize o "não-agir" (a "não-acção",wu wei,無為 ), isto é , deixar-se guiar pelo curso natural e lógico dos eventos do universo.O homem que seguir este príncipio acaba liberto das vicissitudes da vida , e se torna o "Homem Santo" celebrado no Taoísmo.
Uma filosofia deste tipo , logicamente quebra todos os conceitos e tentativas do homem controlar seu destino e demonstra que toda tentativa de se criar uma religião , uma sociedade política ou moral acaba sempre sendo infrutífera.
[editar] Cosmogonia no Tao Te Ching
As ideias cosmogónicas e metafísicas do Tao Te Ching de acordo com algumas ramificações do taoísmo podem ser definidos da seguinte forma:
Tudo nasce do vazio indiferenciado, imensurável, insondável, que nunca pode ser exausto: «o Tao sem nome», que se move em torno de si mesmo sem parar. Deste «Tao sem nome» (que não existe) nasce o que existe (e tem nome): O Caminho (Tao). Não vemos o Tao como Um por causa dos nomes com que designamos o que vemos com os nossos sentidos - as «dez mil coisas» (O caracter chinês que significa «dez mil» é usado, como aliás também no grego, para significar uma míriade, ou seja, um número grande e indefinido.) É com o aparecimento dos nomes que aparecem todas as coisas e o Um se transforma em muitos.
A Virtude (Te) é a manifestação do Tao através da sua misteriosa operação: o chamado «agir não agindo» - a acção involuntária que caracteriza a natureza das coisas - «O modo de Caminhar».
A partir destas ideias cosmogónicas e metafísicas. Lao Tzi deduz um sistema de moral e regras de conduta que tem por objectivo conformar as acções humanas com a ordem natural do Universo. O Homem nasceu do Tao mas depois começou a desviar-se dos seus atributos, ou seja, perdeu a Virtude - o saber como Caminhar. É uma queda que lembra a queda que se seguiu à expulsão de Adão e Eva do Paraíso, segundo a Bíblia. O Caminho do Tao é o caminho de volta ao estado de graça em harmonia com o Tao (o chamado «regresso precoce»).
Tao é normalmente traduzido como Caminho ou Via. Mas apenas por parecer ser «o melhor que se pôde arranjar». De facto, o caminho não se distingue do caminhante ou do caminhar. Não há criador. O universo (o Céu e a Terra) apareceu (e aparece continuamente) a partir do Tao primordial. O que existe aparece do que não existia antes e é eterno. O universo é como um organismo vivo resultante da expansão vitalizada do Tao (a ordem natural, a providência). O Tao manifesta-se continuamente no fluxo e refluxo constante de todas coisas que existem e que foram criadas pela sua actividade.
O Tao não tem personalidade. O que vitaliza o universo são dois princípios ou substâncias que combinados são o Tao: o yang (luz, calor, criativo, masculino) - que existe especialmente concentrado no Céu - e o yin (sombra, frio, receptivo, feminino) - que existe especialmente concentrado na Terra.
Vários filósofos taoístas chineses entendem os versículos que expõem as ideias cosmogónicas sobre o início do universo como sendo, de facto ou também, a descrição do modo como a consciência da realidade externa emerge na nossa mente.
Quando vemos uma cor ou ouvimos um som, há um momento breve inicial em que o nosso cérebro ainda não fez um julgamento sobre a nossa percepção; não sabemos ainda que som ou cor é, nem sequer temos ainda uma consciência clara que estamos a ouvir ou ver alguma coisa. Estamos no domínio «do sem nome», do vazio indiferenciado que nunca pode ser exausto ou descrito. Depois, quando emerge a consciência e o pensamento, que tem por base a linguagem, passamos ao domínio «do que tem nome» e vemos então todas coisas diferenciadas, cada uma com o seu nome. É com o aparecimento dos nomes que aparecem todas as coisas e o Um se transforma em muitos.
Em termos mentais, o Caminho do Tao é o caminho de volta a esse breve «estado de graça» inicial. Um estado em que qualquer trabalho mental interior é eliminado e em que regressamos à nossa espontaneidade natural. As práticas dos Budismos Chan e Zen, que tiveram a sua origem nas ideias taoistas, têm como objectivo exactamente atingir esse estado mental primordial de fusão paradoxal com o Um.
[editar] Trechos
(Cap.1)
O Tao de que se pode falar não é o verdadeiro e eterno Tao.
O nome que pode ser dito não é o verdadeiro nome.
O que não tem nome é a origem do Céu e da Terra
E o nomear é a mãe de todas as coisas.
Sem a intenção de o considerar,
Podemos apreender o mistério e as suas subtilezas,
Através da sua ausência de forma.
Tentando considerá-lo, só podemos ver a sua manifestação
Nas formas que definem o limite das coisas.
Ambos provêm da mesma fonte e são o mesmo.
Diferem apenas devido ao aparecimento dos nomes.
São o mistério mais profundo,
a porta para todos os mistérios.
(Cap.40)
As dez mil coisas nascem a partir do que existe (e tem nome)
E o que existe nasce do que não existe (e não tem nome).
(Cap.4)
O Tao é como o espaço vazio dentro de um vaso;
Mas, por mais que o enchamos, nunca ficará cheio.
É imensurável, como se fosse o Antepassado de todas as coisas.
(Cap.41)
Quando um estudioso mais sábio ouve falar no Tao,
Abraça-o com zelo.
Quando um estudioso médio ouve falar no Tao,
Pensa nele de vez em quando.
Quando um estudioso inferior ouve falar no Tao,
Ri-se às gargalhadas.
Se ele não risse
O Tao não seria o Tao (o Caminho).
(Cap.11)
Trinta raios convergem para o meio de uma roda
Mas é o buraco em que vai entrar o eixo que a torna útil.
Molda-se o barro para fazer um vaso;
É o espaço dentro dele que o torna útil.
Fazem-se portas e janelas para um quarto;
São os buracos que o tornam útil.
Por isso, a vantagem do que está lá
Assenta exclusivamente
na utilidade do que lá não está.
(Cap.48)
Na busca do conhecimento, todos os dias algo é adquirido,
Na busca do Tao, todos os dias algo é deixado para trás.
E cada vez menos é feito
até se atingir a perfeita não-acção.
Quando nada é feito, nada fica por fazer.
Domina-se o mundo deixando as coisas seguirem o seu curso.
E não interferindo.
(Cap.3)
Não exaltar os homens com habilidade superior
Evita que as pessoas rivalizem entre si;
Não dar valor às coisas raras
Evita que surjam ladrões;
Não lhes mostrar o que pode excitar os seus desejos
É o modo de manter os seus corações em paz.
Por isso, o sábio governa simplificando-lhes as mentes,
Enchendo-lhes a barriga,
Enfraquecendo-lhes a ambição
Fortalecendo-lhes os ossos,
Mantendo-os sem conhecimentos e desejos que os desviem do Caminho,
De modo a que os que têm nunca ousem sequer interferir.
Se nada for feito, tudo estará bem.
(Cap.60)
Governa-se um estado
Como se frita um peixe pequeno.
(Para fritar um peixe pequeno, é só deixá-lo fritar; não é preciso virá-lo ou interferir de outro modo qualquer. E usa-se lume brando.)
[editar] A dificuldade de traduzir a língua chinesa
A língua chinesa (e sobretudo a mais antiga) é muito concisa. São frequentes frases sem verbos como «eu grande tu pequeno» ou «eu grande tu» (= sou maior do que tu). Para a traduzir, é necessário compor a frase com pronomes, advérbios, preposições, conjunções, que não estão na língua original.
Enquanto nas línguas ocidentais a gramática é uma estrutura sólida com a qual se podem construir períodos e parágrafos complexos, a gramática chinesa é fluida e flexível. Hoje usam-se sinais de pontuação, mas isso é muito recente. Por isso, como não existem maiúsculas, é por vezes complicado perceber onde começa cada frase. No estilo clássico, utilizavam-se as rimas de palavras para indicar o fim das frases.
Os caracteres são elementos que formam frases com grande versatilidade. Cada caracter (ou palavra) é um elemento móvel na estrutura e influencia o significado e a função dos outros e é influenciada por eles. Dependendo do contexto, a palavra «mestre» pode significar «para servir o mestre», «para seguir o mestre» etc. A palavra «eu» pode significar eu, me, mim, o meu, a minha.
«Bom chá» é um chá que é bom, mas a «chá bom» segue-se um termo de comparação (bom, nessa posição, significa maior do que). «Cão carne» pode significar duas coisas diferentes conforme o contexto: carne de cão ou carne para o cão. Mas «vaca carne» é carne de vaca, porque a vaca é um animal herbívoro.
Na língua escrita de estilo antigo cada palavra, em geral, era escrita usando um único caracter (monossilábico); era um estilo muito mais conciso e literário do que é a língua falada. (Por isso os europeus julgaram inicialmente que o chinês era uma língua monossilábica. Mas a língua falada é mais dissilábica e polissilábica.)
Como o Tao Te Ching foi escrito usando a escrita de estilo antigo, o texto é extremamente conciso e não é de interpretação fácil mesmo para um chinês. O significado de cada monossílabo, no meio de uma série continua de caracteres sem pontuação, não surge expontaneamente; as frases têm uma estrutura mais difícil de detectar. As palavras que rimam sugerem as frases que estão presentes; mas nem sempre elas estão lá e nem sempre a estrutura fica perfeitamente clara. Sabe-se também que o significado e pronúncia de muitos caracteres se foi alterando com o tempo.
Por isso, não é nada certo que para um chinês seja mais fácil compreender o que diz o Tao Te Ching do que para um ocidental. E, provavelmente, nunca será possível ter a certeza absoluta do que é que Lao Tzi queria dizer em cada frase particular. Mas há uma unidade no texto que ajuda a perceber a ideia global.
Ou seja, a informação presente no texto não é uma estrutura sólida com base na qual se possa construir uma interpretação definitiva. Cada porção do texto interliga-se como que orgânica ou quimicamente com as outras e influencia o significado e o seu significado é influenciado por eles. Como a ordem original das várias secções do livro também se desconhece, cada porção é um elemento móvel na estrutura global.
Dois exemplos:
Na busca do conhecimento, todos os dias algo é adquirido,
Na busca do Tao, todos os dias algo é deixado para trás.
E cada vez menos é feito
até se atingir a perfeita não-acção.
Quando nada é feito, nada fica por fazer.
Domina-se o mundo deixando as coisas seguirem o seu curso.
E não interferindo.
Tao Te Ching 道德經 (Cap.48)
Em chinês:
acção aprender dia aumento
acção Tao dia diminuição
diminuição gera nova diminuição
continua até à não acção
não acção contudo não sem acção
obtém-se céu debaixo normal uso sem trabalho
alcança-se isto surgindo trabalho
sem por-si-só usar escolha céu debaixoNota: O mundo é designado por «tudo que está por baixo do Céu».
O Espírito do Vale é imortal.
É a misteriosa vagina maternal.
A sua porta é a raiz do Céu e da Terra.
É como um fio tão fino que se não vê
Mas o seu poder nunca se esgota.
Tao Te Ching 道德經 (Cap.6)
Em chinês:
(Vale, ravina com água) (espírito) (não) (morre)
(correcto) (nome) (obscuro) («garganta funda feminina»)
(obscuro) («garganta funda feminina») (sai dele) (porta)
(correcto) (nome, significado) (Céu) (Terra) (raiz, objecto fino e longo)
(algodão, macio) (algodão, macio) (parece) (existe)
(uso, utilidade) (sai dele) (cresce) (regularmente)Nota: Espírito do Vale é outra designação para o Tao.
[editar] Ver também
[editar] Ligações externas
- Uma excelente tradução em português é O Escrito do Curso e da Sua Virtude de Mário Bruno Sproviero que contêm também o texto em chinês
- Comentários sobre o texto do Tao Te Ching