Moura encantada
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As Mouras encantadas são espíritos, seres fantásticos com poderes sobrenaturais, do folclore popular português. As mouras são também chamadas de moiras ou “encantadas”. Sobre elas Leite de Vasconcelos diz que “são seres obrigados por oculta força sobrenatural a viverem em certo estado de sítio como que entorpecidos ou adormecidos, enquanto determinada circunstancia lhes não quebrar o encanto” [1]. Segundo antigos relatos populares, as mouras encantadas são as almas de donzelas que foram deixadas a guardar os tesouros que os mouros esconderam antes de partir.
As lendas descrevem as mouras encantadas como jovens donzelas de grande beleza ou encantadoras princesas e, segundo Alexandre Parafita, “perigosamente sedutoras” [2]. As mouras aparecem frequentemente cantando e penteando os seus longos cabelos, louros como o ouro ou negros como a noite, com um pente de ouro e prometem tesouros a quem as libertar do encanto. Nas lendas, as mouras encantadas podem assumir diversas formas e existe um grande número de lendas, e de versões da mesma lenda, como resultado de séculos de tradição oral.
As mouras surgem como guardiãs dos locais de passagem para o interior da terra, os locais "limite", onde se acreditava que o sobrenatural podia manifestar-se. Aparecem junto de nascentes, fontes, pontes, rios, poços, cavernas, antigas construções, velhos castelos ou tesouros escondidos.
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[editar] Variantes de Mouras
A Princesa Moura é uma muçulmana encantada que habita um castelo e apaixona-se por um cavaleiro cristão do tempo da Reconquista. A Lenda da Moura Salúquia é uma outra variante, em vez de um cristão, o amor da Princesa Moura é um mouro, um muçulmano. Muitas destas lendas tentam explicar a origem de uma cidade e evocam personagens históricas, outras lendas apresentam um carácter religioso como acontece na lenda de Oureana. No contexto histórico os lugares, as pessoas e acontecimentos situam-se num mundo real e existe uma localização temporal bem definida. No entanto, é possível que factos reais se tenham simplesmente fundido com antigas narrativas lendárias.
A Moura-fiandeira, segundo as lendas, transporta pedras sobre a cabeça e fia com uma roca à cintura. A tradição popular atribui a estas mouras a construção de castros, citânias, e outros monumentos megalíticos. As moedas antigas encontradas nas citânias e castros eram chamadas de "medalha das mouras". A Pedra Formosa encontrada na Citânia de Briteiros terá sido, segundo narrativas populares, levada à cabeça para este local por uma moura que fiava uma roca.
A Pedra-Moura é uma outra variante de moura encantada. Conta-se que quem se sentasse numa destas pedras ficaria encantado, ou se alguma pedra encantada fosse levada para casa os animais poderiam morrer. Acreditava-se, também, que as "Pedras moura" guardavam riquezas encantadas [3]. Existem varias lendas em que a moura em vez de ser uma pedra vivem dentro de uma pedra. Na tradição popular diz-se que no penedo «entra-se para dentro» e «sai-se de dentro» dizer possivelmente relacionado com as lendas das mouras. A moura é, também, descrita a viajar para a mourama sentada numa pedra que pode flutoar no ar ou na água. Dentro de grutas e debaixo das pedras muitas lendas falam que existem palácios com tesouros.
A Moura-serpente é uma moura encantada que pode tomar a forma de uma serpente. Algumas destas mouras serpentes, ou mouras cobra como tambem são chamadas, podem ter asas e podem aparecer como meio mulher meio animal como na lenda da serpente de Noudar ou do Monte d'Assaia.
A Moura-Mãe toma a forma de uma jovem encantada que está grávida e a narrativa centra-se na busca de uma parteira que ajude no nascimento e na recompensa que lhe é dada.
A Moura-Velha é uma mulher idosa; as lendas em que aparecem mouras com figura de velha não são frequentes.
[editar] Elementos das lendas
O ouro das Mouras pode aparecer em variadas formas: figos, pedras, carvões, saias, meadas, animais e instrumentos de trabalho. Existem diferentes meios de se obter o ouro: pode ser oferecido pela moura como recompensa, roubado, ou achado. Frequentemente ouro está dentro de um vaso, escondido dentro de panelas enterradas, ou outros recipientes, o que já levantou a questão se seria alguma alusão a uma urna cinerária.
O dia de São João é o dia em que se acredita que as mouras aparecem com os seus tesouros e que se pode quebrar o seu encantamento. Em algumas lendas é no dia de São João que a moura encantada espalha os figos num penedo, ao luar. Noutras variantes a moura espalha os figos ou a meada de ouro ao sol em cima do penedo. Estas lendas estão possivelmente relacionada com a tradição popular de, nalgumas regiões, apanhar-se no dia de São João o figo lampo, um figo branco, que levava-se de presente. O dia de São João marca a data do solstício de verão, sendo a sua referência talvez a reminiscência de algum culto solar pagão.
A fonte é um dos locais que as mouras aparecem frequentemente e muitas vezes como serpentes e às suas águas muitas vezes se atribuíam virtudes mágicas como a Fonte da Moura Encantada. Também é do costume popular dizer de quem casou em terra alheia que “bebeu da fonte” e ficou enamorado numa alusão às lendas em que os jovens se apaixonam e ficam encantados pelas mouras.
Para se realizar o desencantamento da moura, pode ser solicitado segredo, um beijo, um bolo ou pão sem sal,leite, o pronunciamento de algumas palavras, ou realização de alguma tarefa como não olhar para algo velado e aguentar a curiosidade. Falhar é não desencantar a Moura e “dobrar o encanto”, não obter o tesouro desejado ou perder a moura amada. Nas lendas em que é solicitado o pão levanta-se a hipótese de estarem relacionadas com a antiga tradição de se oferecer alimento aos defuntos. Do mesmo modo podem estar relacionado o leite com as oferendas que se faziam às águas das fontes e às cobras. A população mais antiga contava também que as cobras gostavam muito de leite. Uma das lendas das mouras de Formigais faz referencia à preferência que as mouras tinham por leite.
A moura quando desencantada pode tornar-se humana e casar com o seu salvador ou desaparecer. Na “Lenda do cinto da moura” depois de desencantada os mouros tentam encantar a moura de novo e fazer com que a moura retorne à mourama.
O encantamento da moura pode ser causado pelo pai ou algum outro mouro que a deixou a guardar os tesouros, geralmente é uma figura masculina. São geralmente os mouros que têm o poder de encantar as mouras. Nas lendas, a moura pode aparecer sozinha, acompanhada de outras mouras encantadas ou de um mouro, sendo que o mouro pode ser um pai, a pessoa amada, ou um irmão.
A mourama [4] é um local mágico onde moram os mouros encantados. Nas lendas com um contexto histórico é o local onde os mouros muçulmanos vivem.
O tempo da mouraria representa, nas lendas, um tempo incerto no passado, a mesma referencia intemporal do “Era uma vez”, ou o “Há muito muito tempo” com que começam os contos de fadas.
As mouras eram associadas a vários fenómenos naturais ou elementos da natureza. Acreditava-se que o eco era a voz das mouras. Algumas lendas contam que há locais onde ainda é possível ouvir uma moura a chorar.
Os monumentos funerários são frequentemente associadas às mouras. Em algumas regiões as antas são chamadas popularmente de mouras, ou Casa da Moura e antigamente acreditava-se que as mouras viviam nestas construções. A Pedra da Moura, Antas de Pala da Moura, e a Anta da Arquinha da Moura são exemplo dos monumentos associados às lendas. Outro tipo de sepultura associada às mouras são as sepulturas cavadas na rocha, como é o caso de Cama da Moura , Cova da Moura e Masseira. Segundo a narrativa popular a sepultura chamada Masseira era o lugar onde a “moura amassava o pão” [5]. Numa outra versão da lenda, o monumento pré-histórico Pedra Escrita é o local da sepultura de uma moura.
[editar] Caçadores de tesouros
A lenda do ouro das mouras atraiu alguns caçadores de tesouros. Na busca dos tesouro, as escavações feitas nos locais onde as lendas diziam haver tesouros causaram a destruição de alguns monumentos históricos como mamoas e antas.
Possivelmente o "Pseudo-Turpin" (Liber IV do Liber Sancti Jacobi) [citação] pode ter influenciado, no passado, a crença de que haveria tesouros enterrados pelos mouros.
[editar] Locais das mouras
Vários são os locais associados às lendas das mouras encantadas muitos dos quais são de interesse histórico:
- Povoado Fortificado: Penedo da Moura, Horta da Moura
- Necrópole: Cama da Moura , Necrópole da Moura da Serra
- Anta: Penedo da Moura 1, Casa da Moura, Vale de Moura
- Arte Rupestre: Cabeço da Moura,Toca da Moura
- Sepultura: Sepultura da Cama da Moura
- Dolmen: Dólmen da Lapa da Moura
- Mamoa: Cova da Moura, Capela das Almas Mouras
- Abrigo:Pala da Moura
- Menir:A-de-Moura
- Monumento Megalítico:Casa da Moura (Orca do Gato)
- Gruta: Cova da Moura, Buraca da Moura
- Mina: Cova da Moura
- Tesouro:Moura da Serra
- Lagar: Fraga da Moura
- Gruta Artificial:Casa da Moura do Cabeço de Turquel
- Silo:Rua das Portas de Moura
- Galeria Coberta:Grémio da Lavoura de Moura
[editar] Origem
Julga-se que a lenda das mouras terá a sua origem em tempos pré-romanos. As mouras encantada apresentam varias caracteristicas que se encontram presentes na Banshee das lendas Irlandesas.Também na na mitologia Basca os Mairu (mouros) são os gigantes que construíram os dolmens e os cromeleques. Na Sardenha podemos encontrar os domus das Janas (casa das fadas).
Leite de Vasconcelos levantou a hipótese de as mouras encantadas poderem ter assimilado as caracteristicas de divindades locais, como ninfas e espiritos da natureza. O mesmo juízo fazia Consiglieri Pedroso ao considerar as mouras "génios femininos das águas" [6].
Na Península Ibérica as lendas de mouras encantadas encontram-se também na mitologia Galega e Asturiana. Na tradição oral portuguesa, as Janas são uma outra variante de donzelas encantadas.
Na mitologia polaca a Mora, é o espírito que deixa o corpo dos humanos à noite durante o sono. Na mitologia da Letónia, Māra é a deusa suprema. Na mitologia escandinava Mara, ou Mare, é o espírito errante que deixa o corpo das mulheres durante a noite e causa pesadelos.
[editar] Etímologia
Especula-se que o termo moura (moira) possa derivar da palavra grega "moira", μοίρα, que literalmente significa "destino" e da deusa Moira, originária da mitologia Grega. Também se considera uma possível orígem a palavra latina "maurus", "obscuro", nome dado aos nativos da Mauritânia.
Outra corrente indica que a origem poderá vir das palavras celtas "mori" que significa mar ou "mori-morwen" que designa sereia provavelmente relacionadas também com as ondinas ou as ninfas, os espíritos sub-humanos que habitavam nos rios e nos cursos de água.
Uma outra possível origem de moura (moira), também de origem celta, é "mahra" e "mahr", que significa espírito. [7]
[editar] Literatura
Uma das referencias literárias medievais às mouras encantadas encontra-se na peça Cortes de Júpiter de Gil Vicente representada em 1521:
- “Este romance cantam os planetas e sinos a quatro vozes, pera com as palavras dele e música desencantarem a moura Tais de seu encantamento, a qual entra com o terçado e anel e didal de condão, que Mars disse que ela tinha em seu poder, [...]”
As últimas décadas do século XIX foram marcadas por alguns esforços para se criar um registo escrito das lendas das mouras encantadas. Almeida Garrett, frequentemente citado como um dos pioneiros na recolha de lendas, faz referencia às mouras encantadas no poema D. Branca:
- E vós, formosas mouras encantadas,
- Na noite de S.João ao pé da fonte,
- Áureas tranças com pentes de ouro fino
- Descuidadas penteando-enquanto o orvalho
- Nas esparças madeixas arrocia
- E os lindos aneis de perlas touca.
No livro Os tripeiros: romance-chronica do seculo XIV a moura é descrita:
- "É uma figura branca, toda branca, muito branca, co os cabelos, nem fios de ouro,soltos pelas costas; e aparece a bailar na água de um lado para o outro..."[7]
Vários registos de lendas foram feitos nos séculos XIX e XX por Gentil Marques, Fernanda Frazão, Leite de Vasconcelos.
[editar] Ver também
- Fonte da Moura Encantada
- A lenda da Moura de Salir
- Lenda da Vila de mouros
- Maria José Meireles - autora do livro Lendas de Mouras encantadas
- Castelo de Noudar
- Mitologia
- Mitologia galaica
- Contos de fadas
- Mitologia lusitana
- Sequeirô
- Trasgo
- Zanganito
[editar] Lendas portuguesas
- Abidis
- Lenda da Justiça de Fafe
- Lenda do Galo de Barcelos
- Lenda da Moura Salúquia
- Padeira de Aljubarrota
- Fradinho da mão furada
- Mouras encantadas
- Lenda da Dama Pé-de-Cabra
- Coca
- Lenda da fundação da Sertã
[editar] Lendas portuguesas - Açores
- Lenda das Sete Cidades (Açores)
- Lenda da Rapariga das Laranjas (Açores)
- Lenda da princesa e do pastor no reino das Sete Cidades
- Lenda do rei Branco-Pardo e da rainha Branca-Rosa nas Sete Cidades
- Lenda da Ilha das Sete Cidades
- Lenda das Sete Cidades, Terra de Atlantes
- Lenda do Bispo Genádio e as Sete Cidades
- Lenda das Sete Caldeiras
- Lenda da Coroa Real de Cedros
- Lenda de um Baleeiro da Ilha do Pico
- Lenda da Ermida de Nossa Senhora dos Milagres da ilha do Corvo
- Lenda da Fajã de São João
- Lenda da Lagoa das Furnas
- Lenda da Urzelina
- Lenda do Senhor Santo Cristo
- Lenda do Vai-te com o Diabo
- Lenda da Lagoa do Ginjal
- Lenda da Caldeira de Santo Cristo
- Lenda da Ponta Furada
- Lenda dos Diabretes na Fajã de Vasco Martins
- Lenda do Cavaleiro da ilha do Corvo
- Lenda do Reino de Atlântida e os Açores
- Lenda da descoberta da ilha de Santa Maria
- Lenda da Donzela Encantada da ilha de Santa Maria
- Lenda das Varas do Espírito Santo da ilha de São Jorge
- Lenda Um Salto Para Trás, Mas Sem Olhar
- Lenda do Pezinho de Nossa Senhora
- Lenda de Rabo de Peixe
- Lenda da Atlântida e a Origem do Arquipélago dos Açores
- Lenda de Santo Amaro da Ilha Das Flores
- Lenda do Senhor Jesus de Ponta Delgada
- Lenda da Sereia da Praia
- Lenda do Menino do Coro e a Pomba
- Lenda da Lagoa do Negro
- Lenda de Angra do Heroísmo
[editar] Lendas portuguesas - Madeira
[editar] Ver também
[editar] Referências
- ↑ Vasconcelos, José Leite. (1938). Opusculos (Ed), Volume V , Etnologia (Parte I), Lisboa Imprensa Nacional, p. 496 [1]
- ↑ Leal, Filipa. (10 Abril 2006), Que mouros são esses?, in PJ, Diário de Tás-os-Montes[2]
- ↑ Brandão,Abílio.(1911).Lendas de Mouras encantadas. Revista Lusitana, Volume XIV, Livraria Clássica Editora, Lisboa [3]
- ↑ Sarmento, Francisco Martins; A Mourama, Revista de Guimarães, n.º 100, 1990, pp. 343-353 [4]
- ↑ Tente, Catarina; Lourenço, Sandra.(1998) Sepulturas Medievais escavadas nas rochas dos Conselhos de Carregal do Sal e Gouveia: estudo comparativo, Revista Portuguesa de Arqueologia,(1.2)[5]
- ↑ Medicina na Beira interior da Pré-História ao século XX,nº13 1999, Cadernos de cultura, Ediraia [6]
- ↑ Os tripeiros: romance-chronica do seculo XIV